“Eu vou ligar pro 180”: empoderamento feminino em música de Elza Soares.

por Ivaneide Almeida da Silva

Plano elaborado para 2 aulas

100 min

A proposta destina-se à 3ª série do Ensino Médio, para discutir a violência doméstica contra as mulheres e, ao mesmo tempo, o enfrentamento feminino na música “Maria da Vila Matilde” de Douglas Germano, interpretada por Elza Soares, em seu álbum “A Mulher do Fim do Mundo”. Essa canção dialoga entre o samba e do rock e exorta o grito e a denúncia contra essa violência, através do “Ligue 180”.

CURSO: A Canção Popular no Ensino de História

Objetivos

- Entender a canção como fonte da cultura para estudo de temáticas sociais, políticas e culturais;

- Identificar o contexto sociocultural de uma canção, como compositor, intérprete, produção e circulação, quem fez, por que e para quem;

- Reconhecer e refletir sobre o diálogo entre a melodia e letra na canção “Maria da Vila Matilde”;

- Relacionar o tema narrado na canção "Maria da Vila Matilde", o contexto histórico e cultural de produção e a história de vida de sua intérprete.

- Analisar aspectos sobre a violência da mulher negra no Brasil.

Requisitos

Ouvir a canção “Maria da Vila Matilde”, interpretada por Elza Soares, para reconhecer seus ritmos e a ligação entre música e letra; entender o contexto sociocultural de violência contra a mulher e os serviços e políticas públicas de atendimento às mulheres. Serão estudados textos e links, além da utilização do aparelho de som disco vinil, no intuito de conhecer esse formato de gravação.

Avaliação

A proposta de avaliação dessa aula será a elaboração de um texto descritivo, que estabeleça uma relação entre a narrativa da canção “Maria da Vila Matilde” (utilizando seus trechos e versos), a biografia da cantora Elza Soares e a violência contra a mulher negra no Brasil; e ainda argumentar se há diálogo entre os ritmos da canção, a sua interpretação e o tema ali narrado.

Lista de atividades

Exposição Oral por parte do professor

30 min

A exposição deve começar com a abordagem da canção como fonte para o estudo de diversas temáticas em História. A canção como uma fonte da cultura tem uma linguagem própria, que é necessário entender, pois é, assim como as outras, fruto do contexto sócio histórico e cultural de sua composição, de quem compôs, a que se destina, por que foi feita, por onde circula e como está inserida no álbum ou na obra do artista. Sendo assim a canção representa sua época, um feito, um personagem e até sua forma de representar o mundo. Sobre a música "Maria da Vila Matilde", ela foi o primeiro single do álbum "A Mulher do Fim do Mundo" de Elza Soares, que é o 32º álbum da cantora brasileira, de 2015, lançado pela gravadora Circus. São onze canções produzidas por Guilherme Kastrup e sua parceria com bandas e coletivos paulistas, que marcaram o encontro de Elza e a estética musical contemporânea de São Paulo, que mistura gêneros musicais, tais como samba, rock, rap e eletrônica. O álbum é composto de canções inéditas dedicadas à Elza, muitas fazem referência à sua história de vida, afirma o produtor. “Maria da Vila Matilde” narra a temática da violência doméstica, mas temas como sofrimento urbano, transexualidade, negritude e outros também são abordados em todo o álbum. Nesse momento será indicado e comentado o artigo "Cê Vai Se Arrepender De Levantar A Mão Pra Mim: A Violência Doméstica Exteriorizada Por Elza Soares Na Canção Maria Da Vila Matilde", da Alexandre Almeida e Michele Farias, que analisa a violência doméstica abordada na canção como ferramenta de protexto, discute o contexto, a realidade social, além de relacionar com a vida da intérprete. Outro material comentado nessa exposição é o texto de um programa presentado por Paulo César Soares, produzido pela FUNARTE e gravado pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro, Estúdio F, em junho de 2016, no Rio de Janeiro, especial sobre Elza Soares, com dados sobre sua vida e registros de suas principais gravações. E, por fim, um encarte do ClicRBS, jornal digital de Porto Alegre-RS, sobre o álbum "A Mulher do Fim do Mundo" e seus 60 anos de carreira.

Vídeo/Música/Imagem

25 min

A segunda parte da aula será a escuta da canção, que será feita a partir do disco de vinil, o que irá proporcionar uma experiência diferenciada para muitas e muitos estudantes da terceira série do Ensino Médio, pois estarão diante de um formato diferente de ouvir música. O disco, o encarte, a capa e tudo mais será diferente do que a maioria está acostumada, como as músicas digitalizadas ou em arquivos baixados, ou em 'streaming', ouvidas em 'tempo real', em fluxo contínuo de dados. A proposta é ouvir a música 4 vezes. A primeira vez será uma escuta livre; a segunda vez será requisitado que se escute a melodia, o som, busque um sentido nos ritmos, tentando identificá-los; a terceira será requisitado que se escute a voz da cantora, a entonação que provoca nos versos; e por fim uma escuta que busque o sentido entre a melodia e a letra.

Atividade oral envolvendo a classe (perguntas/respostas/debate)

45 min

A terceira e última parte da aula será um debate sobre a percepção da canção, tanto do encontro entre melodia e letra, como da temática narrada. O começo do debate consiste em identificar os ritmos presentes na canção, como o samba e o rock, a tradição desses ritmos em São Paulo e em outras partes do Brasil e onde esses ritmos circulam, quais os ambientes sociais. A partir disso, pensar o compromisso dos ritmos presentes na canção com a temática evocada.

Em seguida assentar a discussão na temática evocada pela canção. Pensar a violência contra as mulheres no Brasil, os números, as estatísticas e a realidade desses eventos no país. Nesse momento, serão utilizadas notícias e dados sobre violências ocorridas contra as mulheres em algumas regiões brasileiras, para posteriormente abordar as políticas públicas e os serviços públicos gratuitos e anônimos, como o Ligue 180, também presentes nos dados e fontes de jornal distribuídos às e aos estudantes, para que todas e todos sejam estimulados a relacionar o tema da canção aos dados contidos nos materiais disponibilizados, como notícias do site Geledes sobre violência e mulheres negras no Brasil; casos de violência doméstica contra a mulher negra e sobre marcha de mulheres em diferentes sites; notícias de revistas sobre projetos de leis para inibir a violência contra as mulheres; o texto da Lei Maria da Penha; e um artigo da Exame da OAB digital, apresentando algumas leis que promovem o bem-estar da mulher.

As considerações finais do debate serão sobre as “Marias” da canção “‘Maria da Vila Matilde’ (Porque se a da Penha é brava, imagine a da Vila Matilde!)”, que tem título e subtítulo: 1- a Maria da Vila Matilde que liga para o 180, grita e denuncia os maus tratos que sofre com o marido nessa canção; 2- a Maria da Penha, farmacêutica brasileira, da cidade de Fortaleza, no Ceará, que lutou para que seu agressor viesse a ser condenado, e é hoje líder de movimentos de defesa dos direitos das mulheres, vítima emblemática da violência doméstica, que dá nome à lei que foi sancionada em 7 de agosto de 2006, importante ferramenta legislativa no combate à violência doméstica e familiar contra mulheres no Brasil, e fundadora do Instituto Maria da Penha, uma ONG sem fins lucrativos que luta contra a violência doméstica contra a mulher; e 3- outras Marias que, com certeza emergirão durante o debate.

Referências

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